sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Após o riso

Despeço-me de você com certa urgência
não porque quero partir,
mas sim por não aguentar mais segurar.
Amanhece o dia e, logo de cara,
sem clemência,
é ignorado o princípio, o meio
e apresentado o fim.
Peço para que não tente se consolar
procurando de bar em bar
sorrisos de fundo de copo.
Meu espaço será preenchido logo,
quando o semáforo abrir,
quando correr a água suja desse córrego.

Assumo a culpa em partes.
Minha tendência a enlouquecer te assusta
e quando toca o sino da madrugada escura,
você procura meu braço,
mas eu já parti.
E com o conta-gotas, pingo no papelão a dose.
O necessário para abrir a porta
e chamar os anjos pra cantar.

Não tenho certeza se devia me desculpar,
já que minha vitória se dá na sua angústia.
Se queres saber um pouco mais de mim,
afirmo que sinto muito,
mas é pouco demais pra parecer assim, tão ruim.
Coloca um novo quadro na parede,
te ajudo a pendurar...
Se ficares a olhar as nossas fotos,
sei que chorará.

Lembre-se que o sereno dessa noite não trará
nem febre que castiga,
nem cápsulas para a dor passar.
Trará consigo um novo início,
no fundo do poço não se pode mais afundar...
E quando, enfim, deixares de lado minha memória,
colocar no prato as cartas,
incendiar com o fogo que implora,
perceberá que só existi pra te dizer adeus.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Dilúvio espiritual

A bordo do St. Petter,
nuvens negras como seus olhos
e ventos tortuosos
arrancando a pele de meus ossos.
Minha viagem astral,
destino ao infinito, do outro lado da colina,
onde os índios escrevem com tinta
nas cascas de suas árvores de Natal.
Me desloco por esse mar aberto,
com alguns dos antigos amigos,
meu irmão e meu velho,
em busca daquilo que qualquer um quer.
Duvidamos da dúvida escrita na pedra,
do mistério que o divino carrega
e de tudo que o homem criou.
Entoando as canções dos navegantes,
dos pirantas à conquistar suas amantes,
das sereias que destroem a quem breve lhes amou.
O que afunda, hoje, é mágoa antiga
o tempo passa rápido,
cicatriza sua ferida
e me lembra, rapidamente, do que falava meu avô:
"Não sou menino, pois fui consumido pelo tempo.
Enquanto vivi na terra dos homens,
quando o vigor se fazia presente,
quando me chamavam de jovem,
batalhei por quem andava ao meu lado.
Me fiz homem, não morri afogado.
Lutei por aqueles que amei."
Agora, quando salgo minha boca
após os socos das ondas,
acordo meu espírito cada vez mais.
É como se o passado tivesse me iludido...
O hoje desentope meus ouvidos
e eu ouço os cantos celestiais.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Caramba

Não ligo muito para o tempo,
nem pra forma como você o vê.
Eu enxergo dia,
mas não o vejo passar,
não o sinto me levar um pouco mais além.

Além é outra coisa que não sei...
Acho que me perco por desacreditar no que já fui.
Por só pensar em me criar no agora,
me esqueço que um dia fui outrora,
e que sou assim por causa do relógio que insiste em rodar.

Ora pois, pense comigo amigo:
Pra que tanto se ligar ao que passou,
pra que tentar limpar as mágoas que a chuva já lavou,
se podemos somente ir em direção qualquer?
Me lembro que a canção dizia claro,
WE DO NOT CARE!

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Stop the clocks

Encontrava-se parado,
bem no centro da estrada,
enquanto caçadores atiravam
e patos vinham ao chão.
Ouvia o silêncio dos disparos,
sentia o vento do grande caminhão
que passa rápido,
sem nem perceber quem é o tal cidadão.
Se os pés se cansaram,
não sei...
Posso lhe dizer que gastei anos a procurar
e ainda não encontrei.
Se a escolha é dele? Afirmo que sim...
o que pudia fazer já fiz há tempos,
imprimi o roteiro, pauta, os argumentos,
e mesmo assim não pude impedir.
A brisa leva embora o sentimento triste que carrega.
Por de trás dos óculos,
há gotas que ainda o cega.
E mesmo que grite pra que pare,
que ajoelhe e implore que ele fale,
não há som que o faça desistir.
Já vi sonho se formar dentro de mim,
já fiz tudo pra fazer alguém lembrar,
já corri por entre carros,
pulei pontes,
me esqueci,
e descobri que não se encontra quando não é para encontrar.
Quando some de vista de tão longe
e eu sigo olhando o asfalto borbulhar,
faço reza, aperto o terço,
chamo Buda, Krishna ou Alá...
e imploro de maneira humilde
pra que meu amigo não se perca de tanto amar.

sábado, 6 de outubro de 2012

Manhã de sábado

Quero mais um segundo,
um copo fundo,
um respiro a mais.
Essa sua vida à margem,
esse excesso de politicagem
destrói tudo que quero pensar.
"Don't let me down", she said...
Tô na espera,
a flor aguarda que eu a regue,
mas o sofá me chama pra conversar.
Melhor agora do que depois,
já que hora é passageira,
ponteiro que guia as rodas,
você se senta e mundo passa.
Tanto faz a quem se opôs,
a história de guerra agora é verdadeira,
destacam-se visivelmente as frotas,
saca a arma e dispara.
Fim da paranoia ao som dos violões.
O abrir dos olhos verdadeiro,
sem imagem virtual,
pé fixo no trajeto,
imãs presos ao mural.