terça-feira, 31 de julho de 2012

Remédio pra dormir

Ah, que confusão.
Eu sei lá onde é que eu tô,
encafifado com esse treco de calor
que não passa e não me deixa respirar.
Encontro uns respingos de vontade,
vontade de sentir saudade,
vontade de voltar.
Mas mal começa essa tal vida,
velha história que anda ficando tão comprida
que fica impossível enrolar.

Gostava tanto do passado
do velho ato de idolatrar.
De pensar em coisas que se foram,
transpusemos, escrevemos
e que hoje mal consigo me lembrar.
Sei não se é poeira, sei não o que tem aqui.
Hoje eu só penso na besteira de amar quem tanto amei
e não poder vê-la sorrir.

E como sempre repito: ossos do ofício.
Do trabalho árduo de querer o fim
sem nem ter certeza do início.
Troco todo esse pensar e sentir pela calma de poder não ser
e ficando assim, não sendo por aí,
escrevo pouco
amo menos,
vejo cada dia partir.

Hoje não quero ser mais nada
nem amigo, nem poeta,
motorista do velho caminhão que percorre toda essa estrada.
O cansaço bate uma hora e dormir é necessário.
Gastei minhas economias comprando um novo colchão,
cobertores e um pequeno armário.
E depois de falar tanto, pra variar,
vou dormir como um urso, hibernar.
Volto qualquer hora.
O sono é bom pra gente esquecer de pensar.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Táxi

Eu faço plano e malas,
dobro panos e quero que o tempo também dobre.
Espero o que há de se esperar:
o almoço, o jantar
meus amigos tranquilos,
bêbados, pra variar.
Desdobro o estômago, desdou o nó
destravo a garganta, tiro de cima de minha esperança o pó.
O horizonte já se aproxima,
vou na cabine alta, um visão legal de cima,
e de longe já vejo você sorrir.
O retorno é alegria em comprimido,
tomo logo dois,
tá quase na hora de partir.

domingo, 15 de julho de 2012

A transição

Doze passos nos separavam naquele momento
e tremendo, pude te dizer sem medo
que a vida é mesmo uma confusão
e que infelizmente não há espaço pra esperar.
Nessa caminhada obtive chaves que não uso
de portas que nem sei
de corações que nunca toquei
mas que estavam sobre meu poder.
Sobre poder, digo que não devo ter e nem quero
meu domínio se limita à quatro paredes dentro de meu cérebro.
Todo o restante foge da minha noção.
Um inferno grandioso, cercado por vozes que ensurdecem
é uma tortura o nascer do dia
é uma dor o sol partir.
A troca é feita assim:
eu vivo dessa forma errada só pra chegar no fim.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Sr. Everaldo do 420

Essa vizinhança anda meio estranha
Tem adulto correndo atrás de pipa,
criança movendo montanha.
Eu sei lá muito bem sobre o que eles pensam.
Sei que do jeito que tá,
vai acabar logo toda essa andança.
Me parece que a insanidade mora ao lado,
mas nada de bater,
é só entrar.
Tem dias que lá eu passo pra ver tv,
conversar.
Saio meio grogue, cabeça cheia de ar.
Bom pra refrescar...

Tem cercas nos jardins,
coleira no pensar.
É proibido sorrir,
liberado fumar.
Uma bagunça tão, mas tão grande
que dá preguiça de arrumar.

Fica tudo do avesso, o carteiro já nem vem mais entregar
nem carta nem conta nem boleto nem amor pro pessoal amar.
O moço do sorvete comprou um bote e começou a remar.
Tá todo mundo ficando louco,
abandonando o barco, avião, trabalho e o que mais houver pra abandonar.

Vou ficando por aqui, minha janela é boa pra observar.
Enquanto eles temem o futuro, pensam somente no inseguro
eu tomo suco e como bolo de fubá.
De vez em quando compro o Veja,
lustro o vidro pra não embaçar...
Tanto tempo olhando a vida pela janela...
me deu uma vontade de viver...

Vou levantar.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Além do expediente

BEEP BEEP BEEP BEEP!
Levanto!
Água no rosto, café na pança:
Começa de novo.
Uma gravata pra enforcar,
uns trocados pra pagar
o trem.
Pro almoço, o que tiver
come um pouco, levanta, fica de pé.
Abre o olho meio torto, meio pouco.
Não dormiu e nem vai dormir essa noite de novo.
E assim vai indo.
Liga pro patrão, pede informação,
passa cartão, cheque nem pensar.
Vive assim: ouvindo reclamação
pra de noite jantar pão... com pão!
E chega no querido lar,
cansado, só quer conversar.
Encontra saudade de quem não tem perto...
de quem pensou durante todo o dia,
mesmo que quieto,
enquanto lutava contra o viver.
E pode passar chuva, trem
passar café ou não passar ninguém,
que no final, sem pregar o olho, sem dormir
vai lembrar que lá de longe tem uma simples existência que ainda o faz sorrir.
Ahhhhhhh, que bacana.
Mais uma vez ele deita na cama,
pra de novo sonhar com quem ama
e quem queria toda hora ali.