quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Escrevi milhares de cordéis e preguei nas paredes de minha memória. Meus pensamentos vivem lendo minhas próprias palavras o que, no final, acaba confundindo-os.
Dentro de minha cabeça ecoam versos que eu mesmo escrevo. Versos sobre o mundo aqui de fora e sobre os sentimentos daí de dentro. Converso com meus neurônios em prosa e verso. Canto cantigas e danço sambas de roda junto ao meu sub-consciente. Vivo em festa com meus pensamentos.
De relance me vejo preso a uma idéia. Não consigo desgrudar minhas cordas vocais para entoar meus cânticos que outrora animavam a festa de minha memória. Minhas pálpebras ficam coladas e estagnadas. Tudo parece estático.
Deixo para trás meus sonhos que agora mais se parecem com um emaranhado de idéias. Não vivo por mais nada. Sigo no meu pobre estado inercial.
Para um ser que assim vive tudo acaba perdendo as cores. Vejo em tons de cinza. Tudo desbotou. Até eu.
Em uma de minhas caminhadas rumo a lugar algum, acabei encontrando uma bela garota cujo o nome eu não me lembro. Na verdade, não me lembro de quase nada mais. Enfim.
A bela garota me acolheu com um abraço apertado e palavras de conforto que também não me recordo. Me botou para dormir em uma boa cama e lá fiquei por sete anos.
Acordei com os olhos doendo, com minha barba beirando os dois metros. Me levantei e vi, sentada logo ali, a bela garota. Pude ver seus belos olhos azuis, que brilhavam mais que o céu de um dia de sol. Encanto de flor.
Já não entendia muito sobre o mundo. Tudo estava mudado, incluse eu. Estranho é que, vagarosamente, voltava ouvir uma canção soar dentro de minha mente. A mesma canção que fora interrompida sete anos atrás. Perguntei, então, a bela garota: "Qual teu nome?". Ela acenou com a cabeça, negando a resposta. Insisti: "Por favor. Diga-me teu nome?". Enfim ouvi tua voz, suave como veludo: "Não importa meu nome. Saberás quem sou quando voltar a saber quem és."
Eu me vi preso de novo. Olhava pro velho espelho e não recordava meu nome, não reconhecia meu rosto. Com a tesoura velha aparei minha barba e meus cabelos. Voltei a dizer: "Onde estou?". Ela disse: "Está onde devia estar.". Me pegou pelas mãos e me conduziu até a porta. Caminhamos alguns metros por um belo jardim, recoberto de flores das mais diversas cores e tamanhos. Ouvi o canto dos pássaros, vi a cor do céu, senti o vento calmo e o aroma do verão.
Pensei ter caído em mim: "Morri?". Com calma, me respondeu: "Realmente é o que acha? Acha que morrer doeria tão pouco? Acha que sairia do mundo, repousaria e então acordaria aqui? A morte exige muito mais das pessoas. Muito mais força. A morte deve doer muito para você nunca mais querer morrer. Acha mesmo que morreu?". Não sabia mesmo o que havia acontecido comigo. Não sabia onde estava, quem era ela, não me lembrava nem quem eu era.
Sentou ao meu lado em um banco que ali havia e voltou a falar: "Você me criou. Sou o seu amor. Haviam me levado de você, mas um bom amor sempre volta pro seu recanto. Voltei quando mais precisava. Quando seu corpo caía em tentação.". Assustado, disse: "Isso é sonho, então?". E ela me disse: "Não chamaria de sonho. Esse é o teu amor. Agora sabes como ele é e cuidará muito mais dele. Conheça o teu amor e o dê somente a quem merecer. Agora vai, volta pra vida que tem um sonho lá esperando por você pra se tornar realidade.". Me deu um beijo, pisquei meus olhos e voltei a viver.

Um comentário:

Bonecos de Pano disse...

“voltava ouvir uma canção soar dentro de minha mente”... aposto que era a velha canção do bababatibunba thuba babatibum, conduzida pelo rei ourofinense Charlie(hahha). Brincadeiras a parte, pode ter certeza que eu estava em meio ao imenso coral que ansiava cantando, pela sua ressurreição ou simplesmente renovação, amigo.